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Enxergando a vida de outra forma. O que o transplante de córnea me ensinou.

Atualizado: 11 de abr.

Minha experiência com o transplante (lamelar) de córnea; Sei o quanto esse momento pode ser desafiador para quem está passando por algo semelhante e espero que minha história possa ajudar, informar e até tranquilizar aqueles que estão nessa jornada.


Enxergando a vida de outra forma. O que o transplante de córnea me ensinou.

A visão é algo que muitos de nós damos como certo—até que começamos a perdê-la...

Enxergar o mundo com novos olhos é uma experiência única e eu quero dividir cada passo dessa caminhada com você!

Sempre tive uma visão boa, nunca me deu motivo para preocupação. Lia placas à distância, reconhecia rostos de longe e nunca precisei forçar os olhos para enxergar os detalhes ao meu redor. Utilizava óculos com pouco grau, somente para leitura de perto.

Mas, com o tempo, algo começou a mudar...

No início, foi sutil; Pequenos momentos em que minha visão do olho direito parecia levemente embaçada, como se houvesse uma névoa fina diante dos meus olhos, semelhante à um vidro embaçado. Achei que fosse cansaço, algo passageiro, talvez reflexo de dias longos e telas de celular, mas, aos poucos, percebi que não era apenas uma sensação temporária.

As letras começaram a perder nitidez, as luzes à noite pareciam mais difusas, e focar em detalhes exigia mais esforço do que antes. Passei a piscar mais, lavar e lubrificar com colírios os olhos na tentativa de clarear a visão, mas nada adiantava. Foi aí que percebi que algo estava acontecendo...

O caminho até o diagnóstico de "Ceratite bolhosa", foi um misto de incerteza e expectativa. Eu me perguntava o que poderia estar causando essa mudança tão repentina e se havia uma solução. Mal sabia eu que essa jornada me levaria até a necessidade de um transplante de córnea—uma decisão que mudaria minha vida e minha forma de enxergar o mundo.

Receber a notícia de que eu precisaria de um transplante de córnea foi um misto de emoções. Por um lado, havia a esperança de recuperar minha visão e voltar a enxergar o mundo com nitidez. Por outro, a incerteza do tempo de espera e os medos que cercavam a cirurgia pesavam na minha mente.

Entrar na fila de transplante não foi apenas um processo médico, mas também um desafio emocional, eu diria até certa confusão mental, à nível emocional. Saber que minha recuperação dependia da doação de outra pessoa, me fez refletir sobre a fragilidade da vida e sobre a gratidão por aqueles que escolheram dar uma nova chance a alguém, após sua existência neste plano,

A espera foi de 10 meses. Cada dia era um jogo entre a paciência, medo, ansiedade e a vontade de ver tudo com clareza novamente. Eu me perguntava: "Quando vai chegar a minha vez?" ou "E se a cirurgia não der certo?".

No entanto, minha atuação na Psicanálise me trouxe um recurso valioso: a capacidade de olhar para dentro e encontrar equilíbrio diante do desconhecido.

Busquei focar na positividade, lembrando que essa era uma oportunidade para um recomeço.

Foi um período de aprendizado, de resiliência e de fé. A cada consulta da posição na fila, sentia um misto de pavor e de estar um pouco mais perto da mudança. E, quando finalmente recebi a notícia de que o transplante seria realizado, percebi que aquele longo caminho de espera estava prestes a se transformar em uma nova jornada—uma onde eu poderia, enfim, enxergar o mundo com novos olhos.

Dois dias antes da cirurgia...Uma calma profunda tomou conta de mim—tão intensa que eu mesmo não me reconheci!

Era como se, de repente, toda a tensão acumulada tivesse se dissipado. O medo deu lugar a uma aceitação silenciosa, quase inexplicável. Não era descuido ou indiferença, mas uma serenidade genuína, como se meu inconsciente soubesse que tudo aconteceria no momento certo.

Na Psicanálise, falamos muito sobre a relação entre o consciente e o inconsciente, sobre como processamos nossas angústias internamente antes mesmo de percebê-las racionalmente. Talvez minha mente já tivesse encontrado uma resposta antes de eu me dar conta. Talvez fosse uma espécie de preparo emocional, um alívio diante do inevitável.

Em vez de me perder na impaciência, me permiti viver um dia de cada vez, sabendo que cada momento me preparava para a mudança que viria.

Já no hospital, aguardando a equipe...O que sei é que, naquele momento, senti uma confiança inexplicável, que até cochilei durante a espera (rs). Não havia mais espaço para o pânico ou para o "e se?", apenas a certeza de que eu estava exatamente onde deveria estar—e que, independentemente do resultado, eu estava pronta para essa nova etapa!

O pós-operatório: muito menos terrível do que eu Imaginei...

Antes da cirurgia, confesso que imaginei vários cenários assustadores sobre o pós-operatório. Pensei na dor, no desconforto, na possibilidade de complicações. Meu medo era de que cada dia após o transplante fosse uma batalha difícil, cheia de limitações e dificuldades. Mas, para minha surpresa, a realidade foi muito mais tranquila do que eu esperava.

Claro, houve cuidados necessários e um período de adaptação, mas nada comparado ao que minha mente havia projetado. A dor que tanto temia era mínima e, na maior parte do tempo, o que senti foi apenas um leve incômodo, facilmente controlado com a medicação indicada. A recuperação exigiu paciência, mas não foi aquele processo angustiante que eu havia imaginado.

A cada dia, percebia pequenas melhoras, sinais de que tudo estava caminhando bem. E, com isso, fui percebendo o quanto nossa mente pode criar cenários piores do que a realidade. No fim, o que parecia um grande desafio se mostrou uma experiência muito mais leve do que meu medo me fez acreditar.

Essa vivência me trouxe um aprendizado importante: muitas vezes, sofremos mais pelo que imaginamos do que pelo que realmente acontece. O transplante de córnea não foi apenas uma transformação na minha visão, mas também na forma como enxergo meus próprios medos e expectativas.

Como não falar em GRATIDÃO?

E, no meio desse processo, a gratidão se tornou um sentimento constante. Gratidão pela Ciência, que tornou esse transplante possível. Gratidão pelos profissionais de saúde que me acompanharam com tanto cuidado. Gratidão, sobretudo, ao doador e sua família, que, em um momento de dor, permitiram que eu tivesse uma nova chance de enxergar o mundo com clareza.

Essa experiência não só me ensinou que, muitas vezes, sofremos mais pelo que imaginamos do que pelo que realmente acontece, mas, acima de tudo, me ensinou a valorizar cada detalhe – desde a nitidez das cores, até a generosidade humana, que fez tudo isso possível.

Enxergando a vida de outra forma...

A espera, a cirurgia e a recuperação me mostraram que a vida é feita de ciclos, de momentos de incerteza seguidos de renascimentos. Hoje, vejo tudo com mais calma, mais presença e mais gratidão. Porque quando você quase perde algo tão essencial, aprende a valorizar até os menores detalhes—e, no fim, percebe que enxergar vai muito além dos olhos!

A ansiedade com coisas triviais, as preocupações diárias e as frustrações por questões pequenas perderam o seu valor após essa experiência. Ao lidar com algo tão grande e importante, aprendi que a maioria das coisas pelas quais nos angustiamos, se dissolve quando  focamos no que realmente importa: estar saudável (no corpo e na mente) e agradecer à Deus cada novo amanhecer!

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